data-filename="retriever" style="width: 100%;">Enquanto enfrentamos estiagem aqui no Sul, os Estados de Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Paulo convivem com sucessivos episódios de chuvas intensas com inundações, deslizamentos de terras e outros desastres. Somados os episódios de janeiro até agora, já se acumulam dezenas de óbitos humanos.
Estas aflições e emergências levam-me a retornar a um tema necessário: nossa urbanização deu-se afrontando a natureza e nunca seguindo o planejamento que ela oferecia. Aterramos banhados e olhos-d'água, enterramos e poluímos riachos, povoamos desordenadamente margens de rios e encostas de morros, cobrimos superfícies de terra com calçamentos impermeáveis.
Desde as primeiras povoações na Antiguidade, o homem buscou proximidades de rios para se estabelecer. Pensava em água necessária para sobrevivência, terras agriculturáveis, vias navegáveis para o transporte. Era a opção correta.
Mas, nos tempos ditos modernos, imperou a ideia de subjugar e alterar a natureza pelo engenho humano. Na urbanização predominaram concreto e asfalto, na crença de que a tudo podiam dominar. As cidades deixaram de se organizar ao longo dos rios e arroios, respeitando distância segura; não só avançaram sobre suas margens como, muitas vezes, os canalizaram, desviaram o curso, além de entupi-los com lixo e esgoto.
Os morros com cobertura vegetal assegurando sua integridade foram devastados com ocupação desordenada e sem precauções para evitar desmoronamentos. Multidões pobres encontraram nos morros a possibilidade de morar. Aquinhoados, buscaram a melhor vista ou a exposição de suas belas residências. As exigências do automóvel levaram a ruas e avenidas de asfalto, concreto ou outros calçamentos, bloqueando a natural assimilação das chuvas pelo terreno.
Alguns estudiosos alertam que tempestades e chuvas torrenciais serão mais comuns em várias regiões e assim iremos purgar em muitas dolorosas consequências a nossa irresponsabilidade na ocupação do solo urbano. É preciso inverter a lógica de intervir radicalmente sobre a natureza, por uma vertente de usufruir dela sem violentá-la, aprender com ela e seguir o planejamento que nos oferece. O urbanismo deve retornar ao respeito aos cursos de água, às elevações e acidentes dos terrenos, à necessidade do solo absorver boa parte das chuvas. As margens de arroios e rios podem ser ocupadas por parques arborizados, equipamentos de lazer e esportes, hortas comunitárias, etc, porém nunca pelo casario de moradias alagáveis numa enchente.
Não se trata de responsabilidade e decisão apenas de governos, mas de toda a sociedade. Cada um e todos nós temos paternidade sobre os desastres que estão acontecendo ou por acontecer: quando descartamos mal o lixo ou o esgoto, ocupamos áreas de risco, calçamos nossos pátios residenciais sem escoamento adequado, avançamos sobre margens de rios e córregos, enfim afrontamos o "plano diretor" que a natureza nos ofereceu.